O que significa
andar no Espírito?
Recentemente eu
estava ouvindo um sermão da “primeira igreja batista” de Vancouver e me deparei
com algumas interessantes asserções. Dentre elas estava a de que ao andar no Espírito,
é produzido no crente, como diz o apóstolo Paulo, os chamados “frutos do
Espírito”. E nesse andar seríamos então forjados à semelhança das virtudes que
assinalaram a vida de Jesus: amor, alegria, paz. E passaríamos então a tratar
as pessoas em sincronia com o mesmo Espírito que imbuiu o Salvador: com mais
paciência, bondade e generosidade. E, por fim, que ao continuarmos assim nos
passos de Cristo, seria paulatinamente construída em nós a própria maturidade
espiritual interior de Jesus: fidelidade, docilidade e autocontrole.
Deste modo, a
qualidade de vida produzida pelo Espírito do Senhor Jesus Cristo estaria em
total e assinalada oposição aos desígnios do coração não regenerado (daqueles
que ainda não creem Nele, nem o aceitaram como seu Salvador pessoal). E essa
qualidade ou virtude produzida na vida dos que amam a Deus é justamente o que
Paulo quis designar por “frutos do Espírito”.
Diz ainda o
pregador (do sermão em comento) que a palavra “fruto” enfatiza o fato de que
nós não o produzimos. Da mesma forma que os ramos de uma árvore não podem produzi-los sem estarem conectados com ela, da mesma forma procede conosco. Em
estarmos conectados a Jesus, que a si mesmo se denominou como sendo a Videira
verdadeira, passaremos a receber a Sua vida da mesma forma que os ramos da
videira recebem a seiva que lhes dá vida e permite a produção de folhagens e
frutos.
Sob este aspecto,
não seria em decorrência de algum poder interior inerentemente nosso que
poderíamos agir em conformidade com a bondade e perfeição de caráter que Jesus
manifestou enquanto viveu conosco aqui na Terra. O que Paulo ecoa são as
palavras de Cristo em João 15: os bons frutos advêm do fato de já estarmos
vivendo em Cristo e não por mérito nosso.
E dentre o rol dos
frutos do Seu Santo Espírito que ele deseja reproduzir em nós, estaria o amor,
aquele amor abnegado e incondicional que Jesus Cristo manifestou no seu trato
com cada um de nós da família humana.
E Ele certamente
requer isso de todos aqueles que professam serem os Seus seguidores, “porque a mensagem que ouvistes desde o
princípio é esta: que nos amemos uns aos outros (1 João 3:11)”.
Porém, o apóstolo
S. João enfatiza a existência de uma condição essencial – uma causa ou fator
causal inicial – para que esse mesmo amor de Jesus possa se manifestar como uma
virtude em nós.
Dito isso, qual
seria essa condição especial para que possamos, só então, sermos aperfeiçoados
nesse amor de Jesus transcrito acima?
“Aquele, entretanto, que guarda a sua palavra, nele, verdadeiramente, tem sido aperfeiçoado o amor de Deus.
Nisto sabemos que estamos nele:" [1 João 2:6]"
E qual (ou melhor, quem) é essa “palavra” que precisa ser
guardada?
"No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus" [João
1:1]. Vemos que essa palavra é o próprio Jesus. E esse mesmo Jesus nos disse
que um requisito para que o Espírito Santo possa até mesmo ser dado a nós - de
forma eterna - é que guardemos os Seus mandamentos:
"Se me amais, guardareis os meus mandamentos. E eu
rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco" [João 14:15,
16].
Sabemos que esses
mandamentos de Jesus, na nova aliança, estão sendo inscritos no nosso coração
e, em virtude disso, não mais devendo ser obedecidos como uma Lei escrita que exista
fora de nós:
"E porei dentro de vós o meu Espírito, e
farei que andeis nos meus estatutos, e guardeis os meus juízos, e os
observeis... Porei as minhas leis no seu
entendimento, e em seu coração as
escreverei; e eu lhes serei por Deus, e eles me serão por povo."
[Ezequiel 36.27; Hebreus 8.10].
Assim sendo, a
bíblia enfaticamente nos declara que precisamos nos encontrar guardando os mandamentos de
Deus – aqueles que estão sendo reescritos em nossos corações – como
pré-requisito para que possamos até mesmo nos
considerar como estando verdadeiramente “aperfeiçoados
no amor” de Cristo, tal como estão os ramos enxertados na Videira: "Ora, sabemos
que o temos conhecido por isto: se
guardamos os seus mandamentos." [1 João 2:3].
Frise-se que essa “guarda” jamais poderá decorrer de algum mérito nosso,
mas unicamente como o resultado da força e poder a nós concedidos como
corolário da nossa conexão com a Fonte de toda a Vida e Poder: Jesus Cristo.
Não obstante, na medida em que estes mesmos mandamentos estão sendo assim
reescritos em nossa própria natureza interior, então ao guardá-los, já não
estaríamos fazendo outra coisa a não ser seguir os nossos próprios impulsos
assim santificados pelo Espírito.
Nesse aspecto, não
existiria propriamente uma obediência, uma vez que qualquer ato que fizermos
- por ocasião do término desse processo de inscrição das Leis de Deus na nossa
própria mente (e não mais em tábuas de pedra) – já seria um ato de
obediência perfeita no Espírito. O ato de guardar ou obedecer deixaria de
ser um mero esforço humano em tentar observar as santas formalidades legais (do
Sumo Legislador, frise-se) que conflitassem com nossa natureza interior. Isso
porque a nossa natureza já estaria então inteiramente modificada pelo poder da
Graça redentora e transformadora de Cristo; em vista disso, o fazer a Sua vontade já o seria o fazer a nossa própria vontade.
O ato de
continuamente obedecer aos preceitos puros e santos da Lei divina seria tão
fácil como o é para uma pessoa saudável manter a sua respiração (me refiro aqui
ao ato inconsciente de aspirar e expirar).
E nesse sentido, para essas coisas (digo, esses frutos do Espírito) não haveria
mesmo Lei (“old written code”) a nos condenar, uma vez que não precisaríamos
mais dela para nos guiar como anteriormente (quando vivíamos sem o Espírito e
Seu poder renovador).
Mas pergunto: isso
tornaria os princípios dessa Lei – que fora
anteriormente escrita (pelo próprio dedo de Deus e não por homens) em tábuas de pedra – inoperante após a
sua inscrição em nossos corações? É claro que não. Ela apenas passaria a fazer
parte da nossa nova natureza. Não é por outra razão que o apóstolo Paulo disse
reiteradas vezes: “Por conseguinte, a lei é santa; e o mandamento, santo, e
justo, e bom." [Romanos 7:12].
E não por outra
razão também que o apóstolo Tiago declara ser esta Lei reescrita “a lei da
liberdade”. E de fato, ao fazer parte de nós ela se torna uma lei que nos torna
livre da escravidão do pecado. Não mais transgredimos assim a Santa Lei de Deus
graças à nova aliança prometida em Cristo Jesus. Daí a superioridade da “nova” promessa.
Quando você é muito
bom em
fazer algo e sabe que não haveria ninguém melhor que você mesmo para desempenhar
alguma atividade específica e muito importante, certamente então você não
delegaria assunto tão delicado nas mãos de mais ninguém. E assim podemos
entender porque os Dez Mandamentos são a única parte da bíblia que não foi
inspirada pelo Espírito Santo, isso porque o próprio Deus (Jesus) fez questão
de escrevê-los pessoalmente: “O próprio
Deus havia feito as placas e tinha gravado nelas os mandamentos.” [Êxodo
32:16 NTLH].
MAS NÃO ESTARIAMOS COM ISSO SENDO
POSTOS NOVAMENTE DEBAIXO DA VELHA ALIANÇA? PORVENTURA, COM O ADVENTO DA NOVA ALIANÇA,
NÃO FORAM OS 10 MANDAMENTOS ABOLIDOS?
Eu sinceramente
creio que não, e isso pelas seguintes razões, verbis:
“A questão das alianças (ou
concertos) tem sido muito distorcida e mal compreendia. Brevemente, permita-me
informar o que a Antiga Aliança não era os Dez mandamentos. Por quê? Porque
eles não estavam antiquados e prestes a desaparecer (Hebreus 8:13). Eles não
tinham pobres promessas (Hebreus 8:6) e eles não eram defeituosos (Hebreus
8:7).
Então, o que foi a Antiga Aliança
e como foi ratificada? Foi um acordo entre Deus e Israel em Êxodo 19:5-8 por
meio do qual o povo prometia guardar os Dez Mandamentos. Ela foi ratificada com
a aspersão do sangue de novilhos em Êxodo 24:7 e 8. As pobres promessas do povo
falharam porque eles tentaram obedecer exclusivamente com a força humana.
A Nova Aliança foi instituída e
ratificada pelo sangue de Cristo em Sua Morte (Hebreus 12:24; 13:20 e Mateus
26:28). Ela foi efetivada quando Ele morreu: ‘Pois um Testamento só é
confirmado no caso de mortos; visto que de maneira nenhuma tem força de lei
enquanto vive o testador.’ Hebreus 9:17.
Agora observe atentamente também
este ponto sobre a Nova Aliança: “Ainda que uma aliança seja meramente humana,
uma vez ratificada, ninguém a revoga, ou lhe acrescenta alguma coisa” (Gálatas
3:15). Isso significa que após a morte de Cristo nada poderia ser acrescentado
à Nova Aliança ou tirado dela. Isso é porque Cristo introduziu a Ceia do Senhor
na véspera de Sua morte – de modo que ela ocorreria sob a Nova Aliança (Mateus
26:28).
Pense também nesta pergunta, e não
perca o significado dela: Quando se começou a observar o domingo? Todo o mundo
responderá: muito tempo depois da ressurreição de Jesus. Logo o domingo não
pode ser parte da Nova Aliança. Nada poderia ser acrescentado após a morte de
Cristo, o Testador”.
Isso posto, é mesmo
muito estranho até mesmo o ato de se cogitar que os Dez Mandamentos (ou um ou
alguns deles) teriam sido abolidos, isso porque tanto o velho quanto o novo
testamento são muito claros a este respeito:
1)
“são estáveis para sempre e eternamente, vão cumprir-se com verdade e retidão.”
(Salmos 111:8). Eles são eternos, e isso significa que eles não mudam ou serão
apagados.
2)
Eles
são perfeitos desde sempre. "A lei
do SENHOR é perfeita, e refrigera a alma"; (salmos 19:7). E se eles já
eram assim perfeitos, precisaria então a sua função ou propósito mudar?
3)
Se
não fosse por Cristo, nós todos nem teríamos tido a oportunidade de nascer.
Isso porque sem Ele, a posteridade da humanidade ainda estaria sendo irremediavelmente
contada entre os transgressores da Sua Lei. "porquanto derramou a sua alma na
morte; foi contado com os
transgressores; contudo, levou sobre
si o pecado de muitos (....)." (Isaías 53:12).
4)
"Teme a Deus e guarda os seus mandamentos;
porque isto é o dever de todo homem". (Eclesiastes 12:13)
5) “O que desvia os ouvidos de ouvir a lei, até a sua oração será
abominável.” (Provérbios 28:9).
6)
No
Novo Testamento, quebra-los ainda é errado: "Todo aquele que pratica o pecado também transgride a lei, porque o pecado é a transgressão da lei."
(1 João 3:4).
7)
A
humanidade ainda precisa deles. "eu
não teria conhecido o pecado, senão por intermédio da lei; pois não teria eu
conhecido a cobiça, se a lei não dissera: Não cobiçarás." (Romanos
7:7).
8)
Guardá-los
é um sinal de lealdade a Jesus. “Se me
amais, guardareis os meus mandamentos”. (João 14:15).
9)
Eles
ainda são eternos. "E é mais fácil
passar o céu e a terra do que cair um til sequer da Lei". (Lucas
16:17).
10)
Eles ainda são perfeitos. “Não penseis que vim revogar a Lei ou os
Profetas; não vim para revogar, vim para
cumprir”. (Mateus 5:17)
Deus é Eterno e Ele
declara expressamente que não muda de ideia: "Porque eu, o SENHOR, não mudo" [Malaquias 3:6]. “Jesus Cristo é o mesmo, ontem, e hoje, e eternamente.” [Hebreus
13:8].
Sabemos também que
toda a bíblia sagrada é inspirada por Deus [2
Timóteo 3:16, 17]. Por conseguinte, o Espírito
Santo jamais poderia contradizer o Seu próprio testemunho anteriormente
concedido, pois em Deus não pode existir variação ou sombra de mudança (Tiago
1:17).
Lendo Jeremias
28:1-9; 28:15-17 e Isaías 8:20 vemos que a mensagem do verdadeiro profeta se
harmoniza com todas as mensagens que Deus enviou anteriormente através dos
outros profetas. Esses textos implicam que a mensagem dos profetas bíblicos
deve estar de acordo com a lei e o testemunho de Deus, manifestados ao longo de
toda a Bíblia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quando um músico
vai tocar uma sinfonia escrita numa partitura, a sinfonia tem de estar em
conformidade com essa partitura, pois de outra forma não se produziriam os sons
belos e harmoniosos esperados, mas sim uma grande tragédia musical.
Mas ocorre que a “partitura”
Perfeita e Santa que o Espírito Santo compôs, desde os tempos mais antigos da
Eternidade, é justamente a que agora Ele utiliza para dar o “ritmo” melodioso
no qual os Seus seguidores deste mundo devem “sincronizar-se”. Ir em
contradição a isso implicaria o sério risco de nos tornarmos tal como uma nota dissonante
neste infinito Coro Musical do mais Perfeito e Santo amor.
Essa partitura a
que me refiro é a Sua Santa Lei, cujos princípios eternos foram retransmitidos
no monte Sinai e agora estão sendo insculpidos em nossos corações.
Acrescente-se a
isso que, o “andar e o dançar na cadência do Espírito” e, continuamente
durante essa trajetória rítmica, ficar assim exclamando “Oh Yeah, I like that!” (como o pastor do sermão a que aludi no início
desta mensagem), nunca poderá, é bom ressaltar, deixar
de se pautar pela notação musical contida nessa divina Partitura.
Por conseguinte,
não podemos confundir a liberdade que o Espírito nos dá com os extremos da “libertinagem” (espiritual). Nem
podemos confundir também a Graça de Cristo, obtida mediante um Sacrifício
Infinito pago pelo Imaculado Filho de Deus, com uma graça barata, que não exija
nada de nós em retorno. Parafraseando C. S. Lewis, “a Graça de Cristo é sim
gratuita, no entanto custará tudo o que a gente tem”.